Narrativas de uma Destruição - Parte III

Raquel e o Mundo
Estilhaços, palavras soltas. Coisas que quebram, que rompem, que adentram o espaço da existência no limite entre o que era, entre o que se tornou.
Há um pensamento possível sobre o trágico, inerente ao existir, que se apresenta no trabalho de Raquel Ferreira. Está ali o que escapa, o que não se enquadra, o que cria outra forma para  deixar ver o precário, o transitório, o frágil. É preciso pensar sobre o perdido. Há tragicidade nisso.
Na charada moderna nos diriam que o trabalho de Raquel é feito de resto, feito do que deixou de existir. Para os modernos, aqueles do enquadramento, da razão, do código, do projeto, do ponto de chegada (pré) visto, estaria ali o que surge através da destruição do objeto, da morte dele.
 No entanto, há outra dimensão possível: Outras formas, outras maneiras da existência, outros afetos que se erguem quando o dado, o certo, o objeto conhecido se perdeu e deu lugar a instáveis e infindas novas existências.
Nesse sentido, o mundo poético de Raquel se encontra com o nosso, com tudo que pensávamos ter perdido, com tudo que escorreu, fugiu, com tudo que virou acidente, incidente. O Mundo de Raquel mostra o que nos escapa, expõe o que não anda pela estrada da correção, da certeza, do dado. Mas existe, se impõe, com formas que não se deixam prender pela via do conhecimento, que são selvagens a uma forma anterior e um anterior sentido que lhe dê lugar no mundo das coisas que conhecemos.
Nas frases estão os alertas, vários deles. Sinais e recomendações para um caminho de manutenção que tenta insistentemente evitar o que roça o trágico, o que esbarra no jogar os pratos, no desestabilizar o posto, no deixar cair, no jogar pelo prazer de ver surgir o novo do que já quase não vive. Morte para vidas outras. O trabalho que encontra e desassossega os olhos-mentes do público, por ora nessa exposição, é antes de tudo afirmativo. Afirmativo da potência de gerar o vivo mesmo que pra isso seja preciso jogar todas as coisas pelo chão e esperar para ler no outro o que se dá quando descobre-se o possível no caos.
Igor Simões
Prof. Assistente de História, Teoria e Crítica da Arte
Universidade Estadual do Rio Grande do Sul.




Rachel and the World
Splinters, loose words. Things that break, that disrupt, that enter the space of existence in the boundary between what was from what has become.
There is one possible thought about the tragic, inherent in existence, which is present in Raquel Ferreira’s work. It is in there what escapes, which does not fit, which creates another way to let you see the poor, the transient, fragile. You have to think about the lost. There is tragedy in it.
In the modern riddle, one would say that Raquel’s work is made of remains, made of what no longer exists. For the modern ones of the frame, reason, code, design, (pre) seen point of arrival, there would be what comes through the destruction of the object, through its death.
However, there is another possible dimension: Other forms, other ways of life, and other emotions that arise when the given, the taken for granted, the object known is lost and unstable and gave way to endless new existences.
In this sense, the poetic world of Raquel meets ours with everything we thought we had lost, with everything that flowed, ran away, with all that turned into accident, incident. The world of Raquel shows what escapes us, exposes what does not walk the road of correction, of the certain, of the given. But there is, is imposed, with forms that do not allow themselves to hold by way of knowledge, which are wild to a previous one and an earlier sense that gives it a place in the world of the things we know.
In the sentences are the warnings, many of them. Signs and recommendations for a path of maintenance that strongly tries to avoid what skims the tragic, what touches the throw of the dishes, in destabilizing the settled, in letting them fall, in throwing them for the pleasure of watching the new rising from what has almost no life . Death to other lives. The work that meets and disturbs eyes and minds of the public, for now at the exhibition, is first of all affirmative. To the power to generate the living even if it may need to throw all the things on the floor and wait to read in the other what happens when one discovers the possible in chaos.
Igor Simões
 Assistant Professor of History, Theory and Art Criticism
State University of Rio Grande do Sul